O amor precisa do gosto de solidão na boca. Solidão, assim,
deste jeito sem acabamento, porque amamos sozinhos e sozinhos
ficamos sem amor. Amor é uma tarefa solitária, feita por um homem
solitário, que usa uma calça azul, desbotada, destas de cetim, sem
cinto, sempre sem cinto ... Porque amar com cinto é pudor demais, e
com pudor, chame do que quiser, mas não é amor.
Amor é um ato desavergonhado, feito, quase sempre, por dois sem
vergonhas, que se amam sem juízo, como se o amor acontecesse agora
e acabasse nestante, é por isso que vergonha e amor não combinam,
assim como não combina sair com um homem que não te carregue no
colo ou que não saiba abrir uma porta ou puxar uma cadeira. Esses
homens são homens com vergonha demais para amar.
Amar pede, eu repito, uma absurda falta de vergonha, se você
tivesse vergonha, como chamaria sua amada pelos nomes mais banais,
engraçadinhos, fofinhos e gostosinhos, hein? E é por pura falta
vergonha que vocês discutem num cinema lotado ... Pré-estréia de
Harry Potter, todo mundo "shhhh", e vocês nem aí. Pra ela, você é
um safado, idiota, que só quer isto ou aquilo. Pra você, ela é uma
esnobe, que só pensa em si, que só quer as coisas do jeito que acha
certo, e todo mundo "shhhh" ... E no "shhh" do cinema, todo mundo
esquece o filme e olha o casal brigando, porque o filme pode até
ser bom, pode até ter efeito especial, mas briga de casal, por
Deus, briga de casal é o que há e ninguém é doido de perder uma boa
discussão.
O "shhh" do cinema, deixa tão mudo o ambiente, que o casal olha
e encontra todo mundo olhando e para pra perguntar, em coro:
- "Perderam alguma coisa?"
Agora a briga já era, e o casal sai do cinema, antes do filme,
aos beijos mais quentes do pedaço e o filme de verdade vai terminar
no apartamento dele, embaixo de umas cobertas surradas, feitas pela
avó. Os espectadores do cinema, continuam assistindo ao filme,
porque o importante é apenas a briga. Amar todo mundo ama, mas
brigar só briga quem tem classe, não apenas por isso, claro.
É sem vergonha que os casais se despem, ficam nus e se
entrelaçam ... Com vergonha, não há nudez, não a contato
pele-a-pele. No amor, e só no amor, a vergonha é o que menos
importa, vergonha você deixa em casa pra seus filhos, aqueles
pilantrinhas caras de pau. Comigo, seja sem vergonha nos dois
sentidos, naquele, sexy e gostoso, safado e repleto de suor ... E
no outro, claro, naquele sentido mais discordante, porque amar sem
briga é pura dor, mas brigar não é cometer erros, é sentir falta e
entender que falou bobagem, perceber que a machucou, que a fez
chorar e homens de verdade, homens que são mesmo homens, quando
arrancam lágrimas da mulher que amam devem secá-las.
Vale tudo como lenço ... Seja entregar seu cartão para umas
comprinhas no shopping , seja assistir aquela comédia romântica
outra vez, seja parar de beber para sempre, pelo menos até o outro
jogo do Palmeiras.
Amem ser vergonha de amar ... Amem.
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